terça-feira, 20 de abril de 2010

“A História está imbuída de ideologia”


Paulo Machado: palestrante defende retomada dos sujeitos históricos excluídos


Por: Mara Vanessa - 5° período - Jornalismo
mara.vanessa777@gmail.com - AGECOM


“A História é um processo contínuo e frequente método de análise”. É assim que o advogado, pesquisador, escritor e poeta Paulo Machado começa definindo o objeto da segunda palestra promovida pelo projeto Diálogos Necessários na última quinta-feira, 15 de abril, no auditório do CEUT. A iniciativa surgiu para possibilitar maior expansão e integração do circuito interdisciplinar que compõe as mais variadas áreas do conhecimento.

Paulo Machado foi convidado para discorrer sobre a importância e influência da relação (muitas vezes desigual) entre História e Mídia, e de que forma o tratamento dado pela grande imprensa aos diferentes fatos e personagens históricos pode forjar toda a identidade cultural de uma sociedade.

Alguns dos principais pontos debatidos pelo pesquisador foram:

•A importância da história oral

“Os povos ágrafos têm história e importantes documentos históricos não estão, necessariamente, escritos. Espaço e tempo devem ser considerados.”

• Memória Coletiva

“O processo histórico é memória coletiva. Não há história sem memória e não há perpetuação da memória sem consciência.”

• Identidade Cultural

“Quanto mais fortalecida for a identidade cultural, mas forte será a consciência coletiva”.

Paulo Machado reteve atenção especial na concepção, algumas vezes equivocada, de que todos os fatos, datas e personagens históricos sinalizados nos documentos oficiais são reflexo cego da realidade. “A História está imbuída de ideologia. A seleção dos acontecimentos e figuras históricas não é posta de forma aleatória. A supervalorização de determinados segmentos faz parte de uma escolha deliberada”, afirma o estudioso, argumentando também que “devemos nos perguntar sempre quais as causas e efeitos de determinadas escolhas, pois existem muitos sujeitos históricos excluídos”.

A História Oficial brasileira sustenta claros exemplos dessa distorção da realidade, como é o caso da Proclamação da Independência, ensinada nas escolas e perpetuada na tradição do povo como uma luta brava e heróica travada pelo Príncipe Regente Dom Pedro I no ato da emancipação do Brasil contra a Coroa Portuguesa – fato que, após uma reavaliação histórica, ficou provado se tratar de mera ‘utopia embaçada', sustentada para manter a monarquia e o status dos grandes proprietários de Terra no Brasil durante a época imperial, aferrando os ânimos dos habitantes para evitar insurreições.

Os anos de chumbo que permearam a ditadura militar foram protagonistas de muitas versões forjadas, e que foram noticiadas por grandes veículos midiáticos como ‘furos de reportagem, verdades infalíveis’. Aspecto lamentável que pode ser observado no assassinato do jornalista Vladimir Herzog, morto nos porões do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna), em outubro de 1975, e divulgado pela imprensa como suicídio.

Em relação a uma visão mais crítica e coerente dos documentos históricos oficiais, Paulo Machado acentua que “devemos ter cuidado e atenção com a interpretação dos fatos, com a filtragem dos conteúdos”. Segundo ele, é necessário “descobrir as causas, os motivos da exclusão de fatos e indivíduos nos processos históricos, que ocorre frequentemente em forma de criminalização [processo em que há escolha de determinados atores sociais/históricos para figurar como criminosos].

Na sequência da palestra, foi discutida a influência e o poderio de complexos comunicacionais para instituir uma imagem irreal de situações e fatos, com a finalidade de atender interesses político-empresariais. Neste particular, Paulo Machado cita a própria experiência, quando, nos idos de 1970, era estudante secundarista. “Enquanto estudantes secundaristas desvinculados de Grêmios Estudantis - cujo controle pelos censores do governo era total - nós [Paulo e outros ativistas] adotamos uma forma de fazer política de resistência através de jornais mimeografados, como ‘Zero’ e publicações alternativas, caso do jornal ‘Chapada do Corisco’.

Ao final do final do colóquio, o pesquisador citou a importância do artista piauiense Torquato Neto, precursor do Tropicalismo no Brasil (movimento este que, no início, foi intitulado de Tropicália) e do jornalista Alberone Lemos Filho, cujo grande conhecimento e persistência repercutiram em bons textos.

A palestra foi acompanhada e aplaudida por todos os presentes, reforçando a certeza de que o Diálogos Necessários tem sido uma ferramenta crucial na expansão e reformulação de conceitos disseminados no universo acadêmico.

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